domingo, junho 24, 2007

Contra a necessidade do orgulho

Os responsáveis pelo orgulho das minorias são sempre as maiorias. Se a minoria não fosse desprezada, discriminada, perseguida e humilhada, não precisava de revelar o seu orgulho. Mesmo que o orgulho (ou a sua demonstração) seja necessário como contraponto à vergonha e ao medo que a maioria hipócrita tenta impôr, não deixa de ser uma palavra feia.

A própria palavra é feia. Or-gu-lho. Digam lá devagar. Enrola-se toda no fim, antes do -lh, e o próprio gu- que o precede não a embeleza em nada. O sentimento, esse, raramente traz bons resultados.

A necessidade do orgulho é uma vitória da maioria opressora sobre a minoria ostracizada (gosto desta palavra - mas só da palavra). A culpa? Também da outra maioria, da silenciosa, da que não oprime nem persegue às claras, mas que regozija com as piadas homofóbicas que incute como um dado adquirido às gerações seguintes. A maioria do clássico: "não tenho nada contra eles, desde que não venham para o pé de mim". E esta maioria silenciosa vai deixando a outra continuar com a repressão, com a imposição de um medo, uma distância de segurança entre nós e os outros. A clássica história dos fracos e oprimidos. Que só o são porque os supostos fortes assim o querem, podem e mandam. Muitas vezes envolta num manto religioso, guardador dos bons costumes e tradições. Que isto dos maricas é coisa moderna, dizem eles. E há que nos salvar dos anormais, acrescentam. Sem fazer idéia que o conceito de normalidade é puramente matémático e, só por isso, abominável.

Pelo direito à indiferença é dos slogans mais curtos, cáusticos e ao mesmo tempo que mais quer dizer. E, como se alguém me perguntasse ou quisesse saber, defendo o direito e a indiferença sem excepções.


Alguém disse que o preconceito acaba quando maricas deixar de ser insulto. Concordo. Mas também acho que o preconceito acaba quando não for preciso usar a palavra orgulho antes de gay. Que palavra, então? Não sei. Mas, por exemplo, não tenho orgulho nenhum em ser heterossexual. Mas um prazer dos diabos.


PS: para arraial, a música era demasiado techno e a cerveja demasiado cara.

10 Comments:

Jp said...

Discordo da afirmação que o conceito de normalidade ser abominável por apenas ser puramente matemático. Não creio que seja esse o caminho. Para mim, a abominação vai pelo caminho da cultura de massas, do "follow the leader", do rebanho colectivo. Se é isso que implica ser normal, adoro ser chamado de anormal!
Já agora, concordo com tudo o resto, especialmente com a parte do prazer que é ser heterossexual!

PS - No arraial de S. João do Zoológico a cerveja acho que não era cara, a vinhaça não era de certeza. Já a música também não tinha nada de techno, mas andava lá muito pessoal do trance (não é, Nobre?)
PPS - Lolliiitaaaa....

João Gaspar said...

Eu disse, ou quis dizer, que o conceito de normalidade já seria abominável pelo facto de ser matemático. Um exagero da minha parte, até porque não abomino a matemática. Mas, se só por isso já seria abominável, o conceito de normalidade aplicado às pessoas ainda o é mais quando a maior parte dos preconceituosos que tendem a renegar tudo o que não é normal (e não estou a falar só de homossexualidade) fazem-no sem perceberem a dose de pura matemático que essa normalidade implica, tomando como normal tudo o que é parecido com eles.

É sempre o clássico: "eu sou normal, o que é diferente de mim é anormal".

E esta incapacidade de perceber que estar dentro do normal é uma questão de probabilidade mais elevada e de nos acharmos melhores só por isso, gera o preconceito consequente a todas as discriminações. Maricas, pretos (em terra de brancos e vice-versa), há uns anos divorciados, and so on and so on...

Vítor said...

Caro amigo,
A comissão de leitores solicita a activação do Site Feed do Last Breath. Obrigado.

Um abraço,

João Gaspar said...

E isso foi a votos? Quero ver essa acta.

Não tarda descubro como - esta é fácil - e vai ali para a direita.

Anónimo said...

gostei de ler!

João Gaspar said...

Caro Vitor, dá para activar isso sem estar o símbolo do site feed ali ao lado, não dá?

Sou uma besta incompetente, mas acho que sim. Já enablei full content of all posts.

Avisa se já tudo estiver conforme, ok?

Vítor said...

Perfeito. Obrigado.

Ana Matos Pires said...

Boa. Tendo em conta que a prosa veio da mão de irmão do meio, vou-te contar...

João Gaspar said...

Pois, tendo em conta o handicap. ;)

Mas conta, conta.

Anónimo said...

quando visito o teu blog peocuro sempre as partes mais pequenas mas desta vez como olhei para o título e acheio bonito...li. Não sei se percebi, mas estava muito bem escrito. GOSTEI!!!

beijo***